Não que Religião e Ciência tenham que ser inimigas naturais, mas todas as vezes que ambas tratam das mesmas coisas, os conflitos são inevitáveis. O Criacionismo é um dos melhores exemplos.
Vamos ignorar que a maioria dos Criacionistas são no entanto cientificamente leigos, sendo em sua maioria pastores e teólogos. Vamos considerar como válidos mesmo os títulos científicos de criacionistas que os conseguiram em cursos por correspondência não reconhecidos, e ignoremos o fato de que alguns estabelecimentos cristãos fundamentalistas conseguem distribuir diplomas em áreas científicas apesar de constantes brigas judiciais contra o Ministério da Educação dos E.U.A.
Afinal como é possível que tantos indivíduos que passaram por instituições científicas de ensino superior defenderem propostas completamente irracionais e incoerentes com a Ciência?
Os Criacionistas alegam que a Teoria da Evolução é um embuste, uma fraude com o objetivo de anular a Bíblia como fonte Única de Verdade Suprema. Dizem que há uma conspiração secular que predomina no meio científico, com raízes provavelmente no Iluminismo e Positivismo, se não uma manobra ardilosa do próprio Satanás.
Muitos denunciam que a Evolução ao abalar a autoridade do Livro Sagrado, abre caminho para uma sociedade sem "Deus", que segundo eles só pode conduzir à auto destruição e infelicidade, pois só a crença numa criatura onipotente, vigilante e vingativa poderia manter uma sociedade em ordem.
Afirmam que a verdadeira Ciência é a que afirma a glória de Jeová e confirma os ensinamentos da Bíblia. Alguns até acusam o Evolucionismo de Pseudo Ciência, e de que não passa de uma Torre de Babel de falácias e mentiras com objetivo de disseminar uma filosofia ou religião humanista e atéia.
Em síntese, acusam a Ciência de tudo o que eles próprios são também apropriadamente acusados por alguns de seus adversários: Pseudo Cientistas sem compromisso com a verdade e sim com crenças de uma religião ultrapassada e danosa a toda a história da civilização. (Uma crítica comum entre alguns Anti-Criacionistas.)
Entretanto não cabe aqui esticar mais essa difusão de opiniões pessoais a respeito. Cada um pode acusar ao outro das mesmas coisas. Afinal o que é pior? Acreditar ou não em Deus? Estado vinculado ou não a Religião? Democracia ou Teocracia? Formação filosófica e humanista ou doutrinação religiosa?
E segundo os próprios Criacionistas acusam, o que contribuiria melhor para o progresso da Ciência e da Sociedade? Uma postura Evolucionista e Naturalista ou uma Criacionista e Religiosa?
Deixarei de lado por enquanto aspectos morais e éticos da sociedade, e me concentrarei no que se refere ao verdadeiro conhecimento científico.
Os Criacionistas chegam a declarar que enquanto a Evolução não for descartada e a Criação admitida, toda a Ciência estará envolta em erros e estagnação. Vamos comparar então períodos históricos com relação ao desenvolvimento científico e a disseminação das religiões.
O PRIMEIRO PERÍODO
Vai desde o surgimento do homo sapiens até o surgimento da Filosofia Grega e das Filosofias Orientais, que passaram a substituir os mitos pela razão ou intuição investigativa.
Esse período se estende desde cerca de 200 mil anos atrás até cerca de 600 aC. Sendo então o maior de todos os períodos. Embora muitos Criacionistas acreditem na precisão bíblica de que o Ser Humano tem menos de 6000 anos na Terra, o que por incrível que pareça, não afeta o raciocínio uma vez que tal período continua sendo o maior.
Esse foi o período onde ocorreu a maior intensidade de crenças religiosas, Panteístas ou Politeístas. Nunca se tomou conhecimento de que tenha havido algum grupamento humano que não tivesse sua religião. Esse foi também o período de desenvolvimento científico mais lento da história, principalmente em relação ao tempo que durou. Não acredito que alguém discorde disto sem apelar para lendas do tipo Atlântida ou Lemúria.
O SEGUNDO PERÍODO
Vai desde o surgimento da filosofia até seu obscurecimento, tendo durado pouco menos de Mil anos. Nesse período os Filósofos gregos fizeram progressos notáveis na compreensão do mundo. Mapearam os movimentos celestes, deduziram o átomo, alguns já propunham o Heliocentrismo e conclui-se que a Terra não era plana. Foram criados avançados recursos matemáticos, linguísticos e lógicos. foi desenvolvida a Metafísica, a Ética, a Política, a Astronomia. Muitos de seus avanços são sentidos até a atualidade.
No oriente os Hindus calcularam movimentos astronômicos com incrível precisão, inclusive o movimento terrestre de Precessão, que dura 26 mil anos, através de uma elaboração mística filosófica, deram uma idade para o Universo não muito distante da idade atualmente dada pela Ciência e criaram a mais avançada matemática, que até nós chegou na forma do sistema decimal. A China não ficou atrás em termos de desenvolvimento econômico, filosófico e artístico.
Nesse período, principalmente no ocidente, houve uma considerável retração do pensamento religioso, e as primeiras "Faculdades" foram criadas, a Academia de Platão, o Liceu de Aristóteles, e a Biblioteca de Alexandria, onde já se dizia, "A Ciência nos Liberta do Terror dos Deuses".
O TERCEIRO PERÍODO
Vai da ascensão da Igreja de Roma no ocidente, abrangendo toda a Idade Média, cerca de Mil anos, ou seja, equivalente ao período anterior porém incrivelmente mais lenta em termos de progresso do conhecimento. Na verdade ocorreu o contrário, o Heliocentrismo que já fora proposto em Alexandria foi esquecido, técnicas médicas que remontam a Hipócrates, o Pai da Medicina, foram substituídas novamente por exorcismos e feitiçarias.
A Idade da Sombras de fato justifica esse apelido, pois embora tenha sim, havido progresso, ele com certeza foi mais lento. Mas apenas no Ocidente.
Enquanto com base na Bíblia a Igreja reprimia qualquer forma de Filosofia não Cristã, e travava o progresso com seus Dogmas, no oriente médio que a partir da metade da Idade Média seria dominado pelos Muçulmanos, a Ciência se manteve em pleno ritmo.
O resultado foi um enorme atraso da Europa em relação ao Oriente, que descobria Pólvora, inventava a Bússola, usava especiarias para conservar alimentos, criava telescópios e aperfeiçoava a navegação.
Foi o domínio do Cristianismo na Europa, uma autêntica Teocracia.
O QUARTO PERÍODO
Começa a partir do renascimento, que resgatou na Europa o conhecimento antigo grego e se prontificou a tirar o atraso em relação ao oriente. A imprensa aniquilou o controle de informações por parte da Igreja e surgiu o Iluminismo. Os filósofos romperam com a Teologia católica e o Heliocentrismo foi trazido de volta.
Passou a haver uma reação em relação à Igreja a ao Cristianismo tradicional e assim a Ciência avançou novamente acabando por superar o oriente. Por que isso aconteceu?
Provavelmente por que enquanto o Ocidente rompeu de forma bem mais radical com a religião, o Oriente ainda se manteve preso a ela, apesar do Islamismo e Hinduísmo serem bem menos problemáticos com relação a Ciência.
Em menos de 400 anos, o ocidente progrediu muito mais do que nos 1000 anos de Idade Média, em parte resgatando o conhecimento antigo do SEGUNDO PERÍODO.
O QUINTO PERÍODO
Entretanto no QUARTO PERÍODO os cientistas em sua maioria ainda eram crentes, tendo suas limitações religiosas. Somente a partir do final do século XIX no Ocidente rompeu-se definitivamente com o poder do Cristianismo, os Estados passaram a não mais orientar suas constituições através de códigos religiosos e a Ciência ficou definitivamente livre, apesar de ainda enfrentar repressões.
Nesse âmbito a Teoria da Evolução teve um efeito devastador, ela consolidou a Biologia como uma Ciência Plena e estabeleceu sua comunicação com a Geologia e a Física.
Agora não se aceita mais religião, crença e nem mesmo Metafísica no cerne de desenvolvimento científico, foi a vitória do Ceticismo e por fim a Ciência Disparou resultando no mundo que temos hoje em dia.
Esquematizando:
RELIGIÃO | CIÊNCIA | RELIGIÃO | CIÊNCIA | ||||||
PRIMEIRO PERÍODO "200mil"aC - 600 aC | Religiões primitivas, influência máxima da R
| O mínimo desenvolvimento | Religiões primitivas, influência máxima da Religião | O mínimo desenvolvimento | |||||
SEGUNDO PERÍODO 600 aC - 400 dC | Surgimento da Filosofia Grega, menor influência da Religião | Maior desenvolvimento | Surgimento da Filosofia Hindu, Budista, Taoísta e Confuciana. Menor interferência religiosa no pensamento | Maior desenvolvimento | |||||
TERCEIRO PERÍODO 400 dC - 1500 dC | Apogeu do Cristianismo, estado Teocrático, Altíssima influência da religião | Baixo desenvolvimento | Surgimento do Islamismo, baixa interferência religiosa no pensamento | Desenvolvimento estável assim como no período anterior | |||||
QUARTO PERÍODO 1500 dC - 1900 dC | Renascimento e enfraquecimento da Religião | Mais Alto desenvolvimento, o Ocidente ultrapassa o Oriente | Baixa interferência Sem grandes alterações, boa parte do oriente começa a ser dominado pelo ocidente | Desenvolvimento estável assim como no período anterior | |||||
QUINTO PERÍODO 1900 dC - Agora | Baixíssima influência da Religião no pensamento | Máximo desenvolvimento | Baixa influência da Religião no pensamento, embora maior que no Ocidente | Alto, mas menor que no Ocidente. |
Creio que esteja evidente a relação inversa entre Religião e Ciência, pelo menos entre as religiões tradicionais. Os períodos de maior influência religiosa são os de menor desenvolvimento científico.
De fato pode haver convivência harmônica entre religião e Ciência, mas com toda a certeza o Cristianismo foi a que mais travou o desenvolvimento científico, diferente do Budismo e do Hinduísmo, e mais ainda que o Islamismo.
Espiritismo Kardecista, Taoísmo, Neo Panteísmo e diversos outros tipos de religiões novas ou antigas renovadas praticamente não entram em choque com a Ciência. É quase UNICAMENTE o Fundamentalismo Cristão que briga contra a Evolução, e em bem menor grau o Judáico e o Islâmico. Religiões intimamente relacionadas.
Mesmo hoje em dia essa relação continua direta, os países menos desenvolvidos do mundo são os mais influenciados por Religiões, alguns são inclusive Teocráticos.
Diante de tudo isso, é impressionante que exista alguém que ache que estabelecer um conhecimento científico com base na Bíblia seria benéfico para o progresso do conhecimento.
Mas o Criacionistas acham não apenas isso.
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