Quando acuados, ameaçados, assustados, um incrível
fenômeno se processa em nosso corpo; somos invadidos por fortes
descargas de adrenalina, famoso neurotransmissor responsável por
preparar a criatura para dois cursos de ação especifícos: ataque ou
fuga. Sob o efeito da adrenalina, as pupilas dilatam, os coração acelera
os batimentos, os músculos se tensionam, antevendo a necessidade da
ação… A invasão da chamada molécula da ação torna o homem capaz de
feitos fora do comum. Pode expor-se a situações de grande risco e ser
consagrado herói, caso tenha um golpe de sorte. Dependendo da situação,
poderá matar e também morrer. Pode xingar, agredir, perder o tino… Essa é
nossa porção animal regida pelo sistema límbico, o mesmo sistema que
gerencia a ação de presas e predadores no reino das feras.
Os homens, ainda que mais sofisticados, são mui
comumente movidos pelo instinto. Se ameaçados em qualquer situação, o
sistema límbico apresenta logo, antes de qualquer consideração da razão,
um programa de ação para controlar a crise. Em se tratando de gestão de
crises somos grandes estrategistas. Ser um estrategista não significa,
todavia, ter respostas inteligentes para a resolução do conflito. Fato é
que sempre temos uma planozinho. Parecem lógicos esses rascunhos mal
rabiscados de resposta às polêmicas, entretanto, nem sempre trazem o
resultado desejado.
Em momentos cruciais de sua carreira, quando a vida se achava por um triz, sob ameaça, quando a honra estava sendo aviltada, a reputação enxovalhada, Jesus tomava atitudes de todo estranhas… Transitando na contramão da lógica, Ele reagia, em várias ocasiões, de maneira completamente contrária àquela esperada de homens sob pressão. Não perdeu jamais a clareza nem o equilíbrio, não se deixou desorientar pela sanha da ira que pode conduzir a desatinos de consequências trágicas. Tinha sob controle as comportas da emoção e sabia fechar o torniquete quando a porção animal desarvorada desejava tomar o controle de suas ações.
Em momentos cruciais de sua carreira, quando a vida se achava por um triz, sob ameaça, quando a honra estava sendo aviltada, a reputação enxovalhada, Jesus tomava atitudes de todo estranhas… Transitando na contramão da lógica, Ele reagia, em várias ocasiões, de maneira completamente contrária àquela esperada de homens sob pressão. Não perdeu jamais a clareza nem o equilíbrio, não se deixou desorientar pela sanha da ira que pode conduzir a desatinos de consequências trágicas. Tinha sob controle as comportas da emoção e sabia fechar o torniquete quando a porção animal desarvorada desejava tomar o controle de suas ações.
Era natural que os discípulos se vissem perplexos
diante de suas reações e esperassem uma resposta mais vigorosa às
provocações gratuitas e maldosas dos seus opositores. Por que Ele não
revidava? Por que não dava mostras de seu poder, exercendo um justo
juízo sobre os seus perseguidores, simplesmente incinerando-os? Quando,
de certa feita, João e Tiago sugeriram que recorresse ao seu poder,
autorizando-os a fazer descer fogo do céu e consumir aqueles que o
desprezaram, ele respondeu de forma desconcertante ao dizer: “Vós não sabeis de que espírito sois.” Pedro nos informa que, “Quando foi injuriado, não injuriava, e quando padecia não ameaçava. Antes, entregava-se àquele que julga justamente.” (I Pe 2.23)
Em nosso humanismo solidário, chegamos até a
justificar os acessos de fúria que acometem a alguns e os levam a
medidas extremadas; a própria justiça, em casos, atenua o delito
justificando-o como a mais legítima defesa. Geralmente homens ordinários
respondem de forma equivocada e desproporcional aos ataques, estímulos e
provocações do mundo externo. Isto se dá assim porque existe um
descompasso interno que dita suas reações. Somos reféns da lógica das
emoções; pagamos quase sempre, com a “mesma moeda”; só não ferimos ou
matamos, literalmente, nossos desafetos, porque calculamos as
consequências e recuamos diante dos custos. Seríamos, segundo alguns
pensadores, assassinos potenciais.
Não adianta nos besuntarmos com os cremes da
cosmética mágica da mística espiritualista que a religião vende em seu
vasto mercado. Pura fachada. Vende-se por aí, há muitos séculos, métodos
e fórmulas que prometem controlar o bicho louco que carregamos
escondido debaixo do verniz frágil de uma sociabilidade forçada pelas
regras de um jogo que nunca parece suficientemente justo. Esta panacéia
de rezas e mantras, de gurus e sadus, sejam eles de que linha for,
promete muito mas cumpre pouco. É virtualmente impossível conseguir
fazer com que o homem abra mão de sua lógica, quanto mais caminhar
contra ela!
Jesus transitou na contramão. Quando diante de
ameaças que o colocavam em risco, não lançou mão das prerrogativas que
poderiam sustentar seu direito de defesa. Abriu mão da réplica, da
tréplica… sofreu o agravo, e isto calado. Sustentou até o fim, com
atitudes, a mensagem que pregou; não amarelou na hora da verdade, não
destoou, não recorreu a qualquer espécie de subterfúgio que pudesse vir a
desabonar seu ensino. Viveu o que pregou. Cabalmente.
Nossas atitudes, em última instância, vão determinar
se somos o que pregamos, se introjetamos a mensagem que às vezes
queremos empurrar goela abaixo de outros. Temo que meu cristianismo seja
mais fajuto do que queira admitir. Ponho-me diante do espelho e me
pergunto se poderia negar esta afirmação. Mordo os lábios, suo frio, me
contorço diante desta verificação; Encaro os fatos e prossigo. As
contrações anunciam um parto difícil. Por vezes faço média. Considero os
homens, posições, influências… Ainda me debato, justifico, enceno,
manipulo, dissimulo (eufemismo para “minto”)… Esse texto nasce doído,
como confissão arrancada à força numa sessão de tortura. Confesso que
falta a coragem necessária para caminhar na contramão.
Temos nos ludibriado pelos séculos afora,
anunciando-nos como discípulos de um Mestre em cujas pegadas não ousamos
caminhar… É lógico que o Diabo falta morrer de rir diante daquilo que
classificamos como cristianismo. Triste, todavia, é saber que mesmo
depois de refletirmos acerca desse arremedo de cristianismo que temos
vivido, muitos permanecerão vivendo exatamente do mesmo modo! O desafio,
entretanto, segue inalterado, ou tomamos a cruz, negamos as nossas
loucas pretensões e o seguimos, ou não temos parte com Ele.
O discurso da renúncia é talvez hoje um dos mais
rejeitados. É ilógico. É um atentado aos anseios mais naturais da
criatura humana. Antinatural, versa sobre aquilo que não diz respeito
aos interesses de homem algum. A teologia da cruz é absurda aos olhos da
lógica. Por não conseguirmos assimilá-la de forma integral, criamos uma
espécie de simulacro e parece que temos nos contentado com isto. A
julgar por tudo que temos visto, se ousarmos nos perguntar onde é que
tudo isso vai dar, eu não teria tanta certeza em afirmar que seria no
céu. Estou mais inclinado a pensar que seja no outro condomínio.
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