Por Luiz Leite
A uniformidade é burra. O mundo seria muitíssimo
monótono se conseguíssemos colocar um cabresto nas pessoas e forçá-las a
se comportarem à nossa maneira, conformando-se aos nossos gostos. Pode
parecer um clichê apenas, mas é necessário que se repita, a unidade na
diversidade permanece sendo um enorme desafio.
Conviver num ambiente de teologias múltiplas, de
filosofias múltiplas, sempre foi desafiador. A intolerância, a
incapacidade de suportar o diferente, sempre foi o motivo precipitador
de muitas tragédias na história da humanidade. Homens e nações inteiras
se engalfinharam em conflitos mortais simplesmente por labutarem em
campos diferentes de idéias e crenças. As páginas da
história estão repletas de testemunhos a esse respeito; campos ficaram
encharcados de sangue em razão das disputas alimentadas pelo afã
ensandecido de impor sobre o outro os seus próprios termos.
Para não citar os horrores do nazismo, tão
abundantemente divulgados, passam despercebidos e muitas vezes caem no
esquecimento, casos como a chamada noite de São Bartolomeu (24 de agosto de 1572), noite em que, por ordem de Catarina de Médici,
rainha católica da França, as ruas de Paris ficaram ensopadas com o
sangue de protestantes franceses, assassinados em massa. Cerca de 30
mil pessoas perderam suas vidas por causa da implacável intolerância
católica aos huguenotes, designação comum aos protestantes Franceses.
É fácil concluir, quando refletimos sobre tais
coisas, que o homem é um ser em conflito. Sua relação é, consigo, com o
próximo, com o Criador, uma relação, sobretudo, conflituosa. Esse
desalinho observado em sua essência é a fonte de onde se originam todas
as suas neuroses, esquizofrenias, psicoses e demais patologias
determinantes dos comportamentos ora confusos, ora bizarros que conduzem
o ser humano em sua marcha pelo tempo.
Não temos o direito de obrigar os outros a se
conformarem à nossa maneira de ser; mesmo que não concordemos com o
diferente, temos que tolerá-lo, ainda que chegue às raias daquilo que
consideramos como ultraje. Podemos sem dúvida pregar a nossa mensagem,
mesmo porque esse é um direito conquistado, mas impô-la jamais. Toda e
qualquer movimentação nessa direção poderá ser tida como doentia.
É certo, entretanto, que todo grupo étnico, social
ou religioso tem as suas próprias regras e a vida em sociedade nesse
grupo só se faz possível mediante a observação dessas regras. Assim, a
não submissão às regras vão conduzir à ejeção do individuo do mesmo. A
sinagoga amaldiçoa e expulsa da comunidade o herege; a Igreja o
excomunga, persegue e manda para o calabouço ou para as chamas; a
família o deserda; a sociedade o execra, e por aí vai. A regra é
inflexível. Exige que sejamos iguais, que leiamos todos na mesma
cartilha, que nos deixemos amoldar aos códigos sociais. Na verdade essa
regra é a garantia de manutenção do sistema, qualquer que seja ele.
Pergunta Erasmo de Roterdam (c. 1466-1536) em sua obra Elogio à Loucura:
“Que força pode obrigar os homens, naturalmente duros, selvagens e
rústicos, a se agruparem em cidades, para viver em sociedade? A
adulação.”
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